Achei genial o filme ‘O curioso caso de Benjamin Button’, dirigido por David Fincher. A história é baseada num conto escrito em 1922, por F. Scott Fitzgerald (1896-1940), sobre um sujeito "nascido em circunstâncias incomuns". Benjamin nasce velho, em estado degenerativo com catarata e artrite, num quadro médico próximo da morte. O recém-nascido é abandonado pelo desafortunado pai, ironicamente, na escadaria de um asilo, onde é encontrado e adotado por uma funcionária do lugar. Contrariando a expectativa de todos, a criança se recupera “milagrosamente” e convive quase despercebido entre os outros anciãos que vivem no asilo. Benjamin passa os primeiros anos da sua vida assistindo aos outros idosos como ele indo e vindo, enquanto se torna mais jovem e vigoroso a cada ano que passa, na contra mão do ciclo da vida. Ele perfaz uma história ao contrário no tempo, rejuvenescendo a cada aniversário, até se tornar novamente um bebê.
Curiosamente, o que mais me chamou a atenção no filme não foi esse fato inusitado, nem os notáveis efeitos visuais, a maquiagem e a direção de arte, que lhe renderam 3 merecidos oscars - sem contar as brilhantes interpretações de Brad Pitt e Cate Blanchett. O que me encantou foi a narrativa do pitoresco personagem, registrada por ele mesmo num diário que é lido durante o filme. Através das memórias ali contidas sua jornada se descortina diante de nós. Tudo o que Benjamim nos conta, excluindo sua estranha doença – se é que podemos chamar assim – são acontecimentos corriqueiros de uma vida que poderia ser a minha ou a sua. Claro que o filme é poético e romanesco, e penso que a nossa vida deveria mesmo ser mais carregada de poesia e romance. Com efeito, o romance bem amarrado da narrativa gera certa expectativa de como tudo vai terminar devido o caso fora do comum de Benjamim. Na maior parte do tempo, porém, ele vê a vida e as pessoas passando diante de si sem maiores surpresas. O que torna sua narrativa tão especial é a forma como ele conta os acontecimentos - como a entrada dos EUA na Segunda Guerra Mundial - de uma perspectiva toda sua. Nesse aspecto, as pessoas que passam por sua vida se tornam curiosos coadjuvantes nas suas descrições; como o inesquecível sujeito que não perde uma oportunidade para contar como foi atingido 7 vezes por um raio. Mérito do roteirista Eric Roth, que assinou também o roteiro de Forrest Gump, outro famoso contador de histórias.
Ao terminar de assistir a película, não pude deixar de refletir sobre como a nossa existência é de fato especial. Apesar de cada pessoa ser mais um no meio de uma população de quase 7 bilhões de habitantes espalhados pelo globo, de uma perspectiva individual nossa existência é exclusiva. Cada um de nós faz sua própria jornada. Acompanhamos o ciclo da vida com as mesmas necessidades, enfrentado os mesmos problemas e buscando mais ou menos as mesmas coisas. Não importa sob quais circunstâncias nascemos, “Vamos todos para a mesma direção. Apenas seguimos caminhos diferentes para chegar lá” – diz a mãe de Benjamim, em certo momento do filme. Mas ainda assim possuímos algo que nos difere uns dos outros, nossa identidade. O que nos confere uma história interna e pessoal desenvolvida a partir da forma como percebemos o mundo. A vida, contudo, parece indiferente à nossa percepção e mesmo contra todas as possibilidades continua a sua trajetória. Nossa existência, como a de Benjamim, é um milagre e cada novo dia de vida deve ser considerado uma benção, não importa a idade.