quarta-feira, 15 de julho de 2009

Dinossauros, gorilas e Miss Ann Darrow

  No final da semana passada fui a um sebo que reabriu há alguns meses atrás aqui na cidade, à procura do romance “Contato” de Carl Sagan. Aproveitei o momento para dar um terno abraço na saudosa proprietária do estabelecimento, uma querida senhora que desde meus tempos de adolescência guardava os livros e revistas que me interessavam e que não podia pagar no momento – tinha que juntar o dinheiro do lanche para comprar. Quando voltava para buscá-los, ela ainda me dava um desconto no preço.

   Não encontrei o livro que procurava, mas acabei adquirindo outro sobre um assunto que me apaixona desde criança: dinossauros. Escrito por Paul M. Barrett, paleontólogo do Museu de Historia Natural de Londres, o livro “Dinossauros - Uma Historia Natural”, publicado pela Martins Fontes, foi um verdadeiro achado – bem como o valor que paguei por ele. Além de conter informações das descobertas mais recentes da paleontologia, a obra é ricamente ilustrada e deixa qualquer interessado ou mesmo quem não dá a mínima para os bichões, boquiaberto. O autor também foi consultor da série “Parque Pré-Histórico”, documentário produzido pela BBC de Londres - DVD que ganhei de presente de aniversário este ano -, que foi transmitida em partes pelo programa “Fantástico”, da Rede Globo.

   Eu não saberia precisar quando e como surgiu o meu entusiasmo por essas maravilhosas criaturas extintas. O certo, é que desde criança faço parte da lista dos deslumbrados por esses animais. Acho que um dos primeiros contatos com essas criaturas fora através de um livro chamado “Monstros da Pré-História”, da Editora Abril, que era na verdade, uma compilação de uma obra ainda maior intitulada “Os Bichos”, lançada em quatro volumes no final da década de 1970. Tive o prazer de ter essa enciclopédia na estante, quando era mais jovem - gastei metade de um mês de salário do meu primeiro emprego para obtê-la. A obra tratava da vida animal e era cheia de ilustrações belíssimas feitas em aquarela. No quarto volume havia uma seção sobre os animais pré-históricos. Naquela época, os dinossauros ainda eram representados em posição ereta e com a cauda rente ao chão, como suporte, o que mais tarde, durante da década de 1980 descobriu-se estar anatomicamente errado. A cauda dessas criaturas era sustentada reta atrás do corpo, atuando como uma espécie de contrapeso. Apesar de não serem exatas, as ilustrações correspondiam à interpretação que os especialistas davam aos fósseis na época. Foi através de livros como esse que o portal das eras passadas se abriu para mim, resultando no despontar do meu interesse científico. Pude contemplar e até sonhar com o mundo dos dinossauros – sonhei literalmente com um braquiossauro pastando nas proximidades da minha casa.

  Embora tenha obtido uma boa dose de conhecimento sobre como era a vida no nosso planeta há milhões de anos atrás e aprendido, entre outras coisas, o significado da palavra “extinção”, a leitura que verdadeiramente definiu meu fascínio pelos dinossauros ocorreu algum tempo depois. Foi um livro de Edgar Wallace que levou minha imaginação até locais ainda não descobertos no globo onde teriam sobrevivido remanescentes desses répteis colossais. O livro, na verdade, surgiu do argumento para cinema que o autor deixou incompleto quando morreu em 1932, enquanto se dirigia para Hollywood: King Kong. O texto se transformou no filme dirigido por Merian C. Cooper e Ernest B. Schoedsack que tirou o estúdio RKO do buraco – a película foi produzida durante a Grande Depressão, período obscuro da economia estadunidense. Seu lançamento, em 1933, foi um estrondoso sucesso de bilheteria e a história do gorila gigante que se apaixona por uma jovem e linda mulher ganhou o mundo desde então, tornando-se um clássico que atraiu e influenciou gerações. Gerando uma seqüência no mesmo ano (O filho de Kong), e dois remakes: uma produção meio erotizada de 1976 e outra espetacular, mas exagerada de 2005, dirigida por Peter Jackson.

   De fato, o livro não apenas me apresentou um mundo repleto de monstros – uma ilha, na verdade – mas foi também o primeiro livro que li do começo ao fim. Um feito grandioso para mim na época, embora não lembre quantos anos eu tinha. Posso dizer que, após aquela leitura peguei gosto pela coisa e nunca mais parei de ler. Naquela narrativa repleta de aventura, perigos e romance, recheada de criaturas gigantescas e bizarras, eu encontrava os ingredientes ideais para aflorar ainda mais a já fervilhante paixão pelos dinossauros. Embora fossem os coadjuvantes, eles eram tão espetaculares quanto o gorilão apaixonado - uma encenação de “a bela e a fera” em proporções titânicas. Muitas outras coisas me marcaram naquela leitura além dos dinossauros e de Kong: o Empire State Building, o arranha-céu onde Kong trava sua derradeira batalha com os aviões que o alvejam (seqüência imortalizada que se tornou um ícone pop); Nova York, a cidade que nunca dorme; e a belíssima Ann.

  Ann Darrow foi a primeira personagem feminina que me encantou e mexeu com a minha imaginação. Ainda me lembro da passagem, logo nas primeiras páginas, onde o incansável diretor de cinema Carl Denham deixa o cargueiro Venture em busca do rosto que viria a interpretar e dar vida à protagonista de seu filme. Ele segue convicto pelas ruas de Nova York, tentando descobrir nos rostos das mulheres que caminhavam pelas calçadas ou sentadas nos bancos das praças, a expressão ideal. Então, finalmente, num desses acontecimentos fortuitos, ele se depara com Miss Darrow.

  Tenho que admitir que Ann Darrow fora, para a minha mente adolescente e romântica, o estereótipo de mulher ideal. Assim como Denham se lançara em busca do rosto perfeito para o seu filme, fora plantado em mim o conceito da busca de uma companheira perfeita – uma idéia meio antiquada e platônica para a minha idade na época, eu confesso.

  Mas, num certo sentido, diferentemente dos dinossauros que hoje existem somente na forma de fósseis ou na minha imaginação, Ann é bem real. E da mesma maneira como o filme de Carl Denham não poderia existir sem Miss Darrow, a parte mais substancial do meu ser não poderia subsistir sem Ann.

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